Motores: a eficiência no uso do combustível
01/12/2020 2020-12-01 13:38Motores: a eficiência no uso do combustível
Por que não se consegue extrair muito mais que 50% de eficiência dos motores de ciclos Otto e Diesel? Para começar a esclarecer, vamos para alguns postulados da termodinâmica, em especial a Segunda Lei da Termodinâmica, elaborada pelo físico francês Nicolas Léonard Sadi Carnot (1796-1832): para transformar calor em energia cinética usa-se uma máquina térmica, que não é 100% eficiente na conversão. Alguns autores chamam tal enunciado como “postulado” de Kelvin e assim o descrevem: “Nenhum processo é possível em que o único resultado seja a absorção de calor de um reservatório e sua conversão completa em trabalho”.
A segunda lei, entretanto, diz que energia cinética (por exemplo) pode ser integralmente transformada em energia térmica (calor), mas não o contrário, e indica uma qualidade para a energia. Como exemplo, pode-se imaginar um automóvel a 50 km/h que é subitamente freado. Toda sua energia cinética será eventualmente transformada em energia térmica das pastilhas de freio (e outras fontes de atrito) que se aquecerão. Ao fim, certa quantidade de calor será transferida para o meio ambiente. Entretanto, se a mesma quantidade de calor for cedida ao automóvel (ou aos freios), ele não sairá do lugar. Se tal energia fosse proveniente do combustível, grande parte dele seria perdida para aquecer diversos componentes, como o bloco do motor.
Para não ficar uma aula de Física, pode-se resumir que, ao queimar combustível, libera-se energia em forma de calor, a qual o motor tentará ao máximo converter em energia de movimento (cinética).
Contudo, não é possível converter toda essa energia em movimento, pois boa parte da energia (em forma de calor) propaga-se ou, em outras palavras, perde-se para as redondezas de onde foi queimada. No caso do motor a combustão interna, ao queimar gasolina temos calor e pressão dentro do cilindro. Parte desta energia movimenta o pistão, produzindo torque (energia em forma de pressão), e parte é usada para aquecer todas as peças em contato.
A partir do diagrama, considerando que a energia Qa seja a queima do combustível e Qb a perda de energia para as paredes dos cilindros, pode-se dizer que, se não houvesse nenhuma perda de energia para as paredes dos cilindros, poderíamos converter toda a energia em movimento. Daí o raciocínio de que quanto mais quente o motor trabalha, maior sua eficiência: quanto mais quentes as paredes dos cilindros, menor será a energia transmitida.
Como exemplo, imagine que a queima tenha sido de 1.000° C. Se as paredes estão a 100° C (temperatura do líquido de arrefecimento), transfere-se muito menos calor que se estivessem a 50° C. Extrapolando, se a temperatura das paredes fosse de 500° C, muito menos energia seria transferida para o líquido. Contudo, temos diversas limitações mecânicas (temperatura de trabalho que as peças suportam) e químicas (detonação) que impedem o aumento da temperatura de trabalho.
Além disso, usa-se boa parte da energia do combustível para movimentar e manter operante o motor. Perde-se, por exemplo, muita energia em forma de torque no virabrequim durante o tempo de compressão. Energia é perdida também para vencer os atritos internos, acionar válvulas, bombear óleo, etc.
Considerando apenas o ciclo do motor quatro-tempos (sem levar em conta as perdas de atrito e acionamento de bombas de óleo, líquido de arrefecimento, válvulas, entre outros), não se conseguem em teoria rendimentos maiores que a faixa de 50%. Motores a turbinas, usados em aviões, conseguem aumentar o rendimento uma vez que são de queima contínua, ou seja, não possuem ciclos “mortos” que roubam energia. No caso, consome-se parte da energia para tocar o compressor (entrada da turbina), mas não há momentos em que o combustível não esteja queimando.
Então, por que não usá-lo em veículos conectando-o às rodas? Se já reclamamos do retardo de ação de alguns turbocompressores, imagine num sistema com inércias muito maiores, além do alto nível de ruído.
Isso não quer dizer que não haja formas — complexas, é verdade — de aumentar o rendimento global da queima do combustível. Pense em motores geradores em grandes fábricas ou navios, com potência na casa dos milhares de cv. Queima-se o combustível e gera-se energia elétrica em um rendimento de, digamos, 40%. Mas os gases queimados em altíssima temperatura — que no automóvel são desperdiçados no escapamento para a atmosfera — são aproveitados para aquecer grandes quantidades de água, que é então transformada em vapor e usada em geradores elétricos tocados por turbinas a vapor.
Também é possível usar o líquido de arrefecimento do motor como fonte de energia para trocar calor com um reservatório de água limpa, a ser empregada (já quente) em alguma função na fábrica, como lavar vasilhames, ou para banhos quentes no navio. Assim, não se gasta energia elétrica para aquecer a água necessária. Em fábricas de refrigerante pode-se coletar o gás carbônico (CO2) liberado na saída do escapamento para injetá-lo no refrigerante, e por aí vai, até chegarmos muitas vezes a um rendimento térmico global — energia liberada pela queima do combustível — acima de 80%.