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Qual a relação de correr usando máscara com motores de corrida?

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Curiosidades

Qual a relação de correr usando máscara com motores de corrida?

Nestes tempos de pandemia fui fazer minha corrida usual usando uma máscara para cobrir nariz e boca e não pude deixar de pensar nos motores de diversas categorias de corridas. E em nada tem haver com o uso do filtro de ar e sim com o restritor, ou gargalo, utilizados como modo de limitar a potência dos motores.

O principal efeito e que correlaciona melhor com o restritor do motor de corrida é a nítida restrição na capacidade de inspirar, sem contar que se acaba respirando parte do próprio ar expelido (mais ou menos como o sistema EGR dos motores que no caso está lá para trazer benefícios). Impressionante o quanto tive de dificuldade em aspirar o ar necessário para manter meu ritmo, reduzindo sensivelmente o desempenho bem como na incapacidade de elevar os batimentos cardíacos ao limite que estou acostumado. Falando em números, não consegui ultrapassar os 173bpm utilizando a máscara enquanto sem máscara chego aos 192bpm nos sprints. Ou seja, fazendo uma correlação didática, é como se o motor não conseguisse aspirar muito ar – no caso a quantidade de ar alimentando os pulmões – e por consequência os injetores e vazão de combustível não estivessem no seu máximo – no caso o coração não subia mais os batimentos por não ter mais ar para ser bombeado – causando um efeito muito semelhante quando o motor está em altitude com a borboleta totalmente aberta mas com pouco ar sendo admitido e consequentemente injetando menor quantidade de combustível. Aliás, até já fizemos um vídeo sobre a perda de potência de um motor por altitude:

https://www.youtube.com/watch?v=wq029x6aSGw&t=34s

Mas o que isto tem a ver com os motores de corrida e seus restritores? Muitos pensariam: “Não deveria ser correlacionado com o filtro de ar?”. Por incrível que pareça não: A restrição de ar dos filtros de ar é praticamente desprezível, quando novos e limpos, muito graças a sua grande área. Afinal, tente comparar a área de abertura da válvula de admissão com a área do filtro de ar e tente imaginar qual cria maior restrição. De qualquer forma um dia faremos um tópico unicamente referente aos filtros de ar, incluindo os esportivos. O foco agora é explicar o conceito por trás dos restritores de ar que utilizam o princípio do “Efeito de Venturi”.

Retritor de ar em um Dodge Viper para encadrá-lo na mesma categoria de seus concorrentes, reduzindo sua potência original de 650hp para aproximadamente 500cv

Efeito Venturi é quando se diminui a seção de um tubo de escoamento com o intuito de criar uma zona de baixa pressão, como nos carburadores para que o combustível seja “sugado” da cuba, ou para criar um limite máximo de escoamento de ar naquela seção graças as leis descritas pela “Mecânica dos fluídos”. O comportamento da temperatura e pressão do ar – ou qualquer fluído – muda ao ultrapassar Mach 1 (a velocidade do som no meio). Por exemplo, imaginando a asa e fuselagem de um avião: Até Mach 1, o ar esfria a superfície a fuselagem enquanto acima ele esquenta – tanto que fragmentos do espaço pegam fogo ao entrar na atmosféra devido à alta velocidade e atrito com o ar. Outro ponto interessante é a inversão das diferenças de pressão ao passar de Mach 1, ou em outras palavras, onde havia o efeito de baixa pressão até Mach 1 se começa a ter pressão positiva, como na parte superior da asa, obrigando que os aviões que passam de Mach 1 tenham o perfil de asa plana.

 

Já em dutos fechados, a velocidade Mach 1 não pode ser superada, o que cria um limite de quanto de ar se consegue passar pela seção que atingiu Mach 1. Obviamente que se aumentarmos a pressão do ar, como no caso do uso de um turbo-compressor, coseguiremos “empurrar” mais ar para dentro do motor pois o mesmo estará mais denso – maior número de moléculas por volume – mas a velocidade será sempre limitada em Mach1.

Efeito Venturi: Velocidade do ar não ultrapassa Mach 1 na região de menor área

Indo para um exemplo mais prático, categorias que permitem o uso de vário tipos de motores ou marcas nivelam a potência dos carros utilizando um restritor na admissão de ar do motor. Se por acaso o motor for turbo, se coloca o restritor antes da entrada do turbo, mantendo-o na região de pressão atmosférica. Um exemplo deste tipo de utilização é o Fórmula SAE que exige o uso de um restritor de 20mm de diâmetro o que limita o fluxo de ar para o motor conforme a figura abaixo, retirada de um artigo científico da “Faculty of Transport Engineering of Vilnius Gediminas Technical University”:

Restritor de ar de 20mm na entrada do coletor de admissão

 

Ou seja, não importa qual motor cada equipe irá utilizar uma vez que só haverá aumento de potência se o motor for mais eficiente, ou em outras palavras, conseguir gerar mais potência com a mesma quantidade de ar admitida. Correlacionando com o uso da máscara durante minha corrida, só vou conseguir correr mais se meus pulmões conseguirem absorver mais oxigênio daquela quantidade de ar inspirada. Mas voltando ao motor, o artigo mostra no gráfico abaixo a diferença de potência do mesmo motor com e sem o restritor:

Potência e rotação de operação do motor nitidamente reduzida com o emprego do restritor

 

No caso do estudo, o motor atinge seu pico de potência máxima em 10500rpm uma vez que não consegue puxar mais ar para trabalhar com rotação mais alta, e consequentemente com maior potência, o que justifica a correlação. Um alternativa para se ganhar em desempenho, se fosse permitido pelas regras da categoria, seria a utilização de um turbo-compressor que no caso não aumentaria a potência – visto que a vazão de ar estaria restrita na entrada do turbo. Contudo o motor não precisaria chegar nos 10500rpm para produzir a potência máxima já que o turbo ajudaria a puxar o máximo de ar possível em rotações mais baixas, gerando um gráfico de potência plano e com isso aumentando a agilidade do carro nas saídas de curva ou entre trocas de marchas uma vez que dificilmente se está aos 10500rpm o tempo todo – a não ser que o carro em questão usasse uma CVT.

 

Referências:

https://www.popularmechanics.com/cars/a10457/can-you-spot-the-heartbreak-in-this-srt-viper-race-car-photo/

https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1877705817319227

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