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Renault Captur Intense 1.3 TCe

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Renault Captur Intense 1.3 TCe

Análises técnicas por Felipe Hoffmann.

O Renault Captur foi lançado no Brasil em 2017 como mais uma opção no congestionado segmento de SUVs pequenos. Baseado no Kaptur desenvolvido para o mercado russo, oferecia inicialmente motorização 2.0 com câmbio automático de 4 marchas ou 1.6 de origem Nissan com câmbio manual, sendo este motor posteriormente oferecido também com câmbio CVT. O Captur nunca chegou a ter grande protagonismo no mercado, em parte por conta de seu parentesco e concorrência interna com o Renault Duster: se por um lado esse compartilhamento de plataforma trazia robustez e custos de manutenção comedidos, por outro significava um interior pouco requintado que afastava alguns consumidores, ainda que o Captur tenha bons predicados como um rodar suave e silencioso comparável aos melhores do segmento.  Além disso a oferta de motores parecia pouco atraente aos olhos de parte do mercado: a versão 2.0 oferecia desempenho adequado, mas o câmbio de 4 marchas tornava-se hesitante em algumas situações e implicava em rotações mais altas que o necessário em velocidades cruzeiro em rodovias, prejudicando o consumo; a versão 1.6 trazia fraco desempenho, mais por conta da calibração do CVT totalmente voltada para a economia, mantendo o motor sempre em baixíssimas rotações e prejudicando o desempenho em retomadas do que por conta da potência do motor em si. Mas a Renault tinha algo melhor na prateleira, o 1.3 TCe desenvolvido em conjunto com a Mercedes-Benz já disponível em diversos outros mercados e inclusive no Brasil pela própria Mercedes. Essa é a grande novidade do Captur Intense TCe 2022, mas será que esse novo motor cumpre as promessas de melhor desempenho e menor consumo?

Sob o capô

Adaptar um motor para o Brasil é demorado e caro por conta principalmente da gasolina com alta quantidade de etanol e da necessidade que o mercado impõe da flexibilidade em combustível. Mesmo que a Renault não ofertasse o motor TCe com versão flex, as adaptações no sistema de injeção seriam necessárias em função dos 27% de etanol que tornam o combustível mais “abrasivo”. Fora o fato de termos leis próprias de emissões que obrigam adotar algumas vezes até catalisador diferente da versão europeia. São necessários novos mapas de injeção, testes de calibração que implicam inclusive em novos mapas de câmbio, e tudo isso requer tempo (além de dinheiro), tornando lenta a introdução de novos motores no mercado nacional. Sem esquecer a questão da fabricação do bloco e componentes, que quando importados tornam-se extremamente caros em função do câmbio desvalorizado em relação ao Real.

Mas a espera valeu a pena pois o motor traz vitalidade ao Captur TCe, que aliado à boa calibração da CVT traz a sensação de leveza e agilidade, além de bom consumo. Como citado, a Renault acertou bem a mão no ajuste da CVT da versão 1.3T, o oposto do conjunto 1.6 aspirado já testado no Sandero e Duster. Interessante que o mesmo conjunto 1.6 equipa o Nissan Kicks, que conta com boa agilidade e acerto. O novo motor gera 162/170cv@5500rpm e torque de 27,5kgfm@1600rpm com ambos os combustíveis.

O motor 1.3 TCe conta com boas tecnologias como injeção direta e turbo compressor tanto para aumento de potência como para melhora no consumo. Interessante é o intercooler, que fica lateralmente ao radiador e conta com uma ventoinha própria:

 

Em uso normal o motorista “esquece” que o câmbio existe. Em outras palavras o casamento entre motor e câmbio ficou muito bom, sem qualquer aspecto que incomode, pelo contrário: as respostas ao acelerador são muito rápidas em nada lembrando as motorizações anteriores. Embora a Renault tenha programado a caixa CVT para simular 8 marchas (e fazer propaganda disso), no dia a dia em rotações médias mal se percebe essa simulação, que só surge em situações de aceleração total como um teste de 0 a 100km/h por exemplo.

Suspensão, direção e freios

O Captur utiliza elementos bem conhecidos em suspensão e freios com bons resultados. A suspensão dianteira utiliza o sistema MacPherson e a traseira possui eixo de torção, assim como os freios dianteiros são a disco ventilado e os traseiros a tambor de ferro fundido. Talvez o modelo merecesse a suspensão traseira multilink utilizada no extinto Duster 4×4 e na Oroch e discos atrás, mais por questões de marketing do que de comportamento propriamente dito, visto que suspensão e freios são adequados. Apesar da enorme altura em relação ao solo (21 cm) a carroceria do Captur inclina pouco em curvas de alta velocidade. O mesmo não pode ser dito do motorista e passageiros, que por conta da altura do veículo e dos bancos acabam sentindo as movimentações laterais muito mais que em um veículo mais baixo. A absorção de impactos rápidos é boa juntamente com o movimento da carroceria em oscilações grandes, como passar numa lombada. As respostas ao volante também são apropriadas, sem grande esforço graças à assistência elétrica. Entretanto a direção do Captur é sensível a irregularidades do asfalto, especialmente em curvas em alta velocidade. Essa situação foi atenuada na versão 1.3T, mas trata-se de característica de projeto que não pode ser totalmente eliminada, em função da geometria da suspensão.

Habitáculo, acabamento interno e porta-malas

O design externo do Captur sempre foi elogiado por muitos por conta de suas linhas mais suaves, menos abrutalhadas que a de seus concorrentes. O mesmo não pode ser dito do seu interior, considerado espartano demais por parte dos consumidores dentro do segmento em que o Captur se encaixa. A versão Intense TCe 2022 trouxe melhorias, mas não mudou significativamente a percepção de qualidade do interior do veículo. Diferentemente da versão Iconic, que possui revestimento emborrachado na parte superior do painel, a versão Intense mantém o mesmo acabamento em plástico rugoso do Captur anterior. O revestimento sintético dos bancos passou a ter textura mais suave que a usada anteriormente, que era lisa e dura.

O console central à frente da alavanca de câmbio ganhou um porta trecos e um apoio de mãos, revestidos do mesmo material dos bancos e costurado, com a vantagem de que os botões do controle de cruzeiro, antes em local esquisito à frente da alavanca do freio de mão, passaram para o volante. Agora estão adequadamente localizados nesse novo console o botão do modo ECO e os botões que desativam o controle de tração, do sistema start/stop e dos sensores de estacionamento.

Ainda no console central houve ganho também na parte de trás, um novo porta trecos com tampa e duas saídas USB para uso dos passageiros de trás.

O painel de instrumentos continua o mesmo, com acréscimo no computador de bordo do monitor de pressão dos pneus (por diferença no diâmetro de rodagem entre eles. Primeiro calibra-se os quatro pneus e o monitor é zerado. Depois disso se algum pneu murchar o monitor avisa. Não há indicação da pressão em cada pneu) e de indicador de temperatura do motor.

Detalhes positivos do Captur diante da concorrência são os retrovisores externos de bom tamanho, o esquerdo com uma faixa mais convexa para aumento do campo de visão; grande área envidraçada que permite boa visão lateral, ainda que as colunas dianteiras sejam largas e atrapalhem em certos ângulos de manobra; direção com peso  correto, agora mais macia por conta da assistência elétrica e com centro bem definido (em curvas de esquina a direção volta prontamente para o centro); e silêncio de rodagem, este talvez um dos maiores destaques do Captur em que a Renault não economizou. O capô possui manta fonoabsorvente, material presente também na parede cortafogo, e até a parte interna dos paralamas possui acabamento acarpetado para absorver ruídos de areia e pedrinhas batendo na carroceria. A Renault informa que a rigidez da carroceria do Captur TCe teve aumento de 12,5% em relação às versões anteriores, o que se traduz menores ruídos causados por torção no interior do veículo.

Se por um lado houve melhorias, por outro a Renault modificou sem necessidade a altura do banco do motorista em cerca de 1 cm, quando na posição de regulagem mais baixa. Sem necessidade porque o banco anterior já era bastante alto, e embora 1cm pareça pouco é o suficiente para desagradar tanto motoristas mais baixos, que podem ter dificuldade para alcançar os pedais de forma confortável, quanto os mais altos, que acabam ficando com a cabeça muito próxima do teto. Se as fábricas querem atender os pedidos dos clientes por bancos com ancoragem cada vez mais alta, é melhor que o façam por meio de regulagem que permita que o banco suba quase até furar o teto, mas que também permita uma posição mais baixa para motoristas que assim prefiram. Outra limitação do Captur é o espaço para pernas dos passageiros do banco traseiro, não tão espaçoso quanto o grande entreeixos do veículo permite imaginar. Nesse caso parece ter sido escolha da fábrica privilegiar o porta-malas, com capacidade para bons 437 litros, colocando o banco traseiro em posição um pouco mais à frente mas reduzindo o espaço interno.

A dotação de equipamentos de segurança está na média do segmento quando comparada às versões mais simples dos concorrentes, mas perde quando comparada às versões superiores: o Captur possui ABS, 4 airbags (dois laterais), sistema Isofix no banco traseiro, controle eletrônico de tração e estabilidade, assistência para partida em rampa. Mas fica devendo itens mais sofisticados já presentes em alguns concorrentes, como sensor de ponto cego nos retrovisores e algum grau de direção autônoma, como frenagem automática por exemplo. Dois itens simples e úteis, cada vez menos presentes em diversos modelos, estão no Captur: a regulagem de altura do facho dos faróis e de intensidade da iluminação do painel por meio de roldana:

Central multimídia

O Captur TCe Intense vem equipado com a nova central multimídia compartilhada com os demais modelos da Renault, chamada EasyLink. Em nossos testes o pareamento com iPhone foi simples e rápido (via cabo USB), permitindo utilizar aplicativos como o Waze por exemplo. A conexão também pode ser feita via Android Auto. As respostas da tela capacitiva melhoraram muito em relação ao antigo sistema MediaNav utilizado nas versões anteriores. As linhas do assistente de estacionamento agora se movem (antes eram fixas). Ainda que a versão Intense não venha equipada com o sistema de som Bose (disponível apenas na Iconic), a qualidade do som é boa e potente não havendo distorção mesmo em volume máximo. Aspectos que foram mantidos são o Eco Coaching (um auxílio à condução econômica, sua pontuação aumenta quanto mais econômico é o modo de conduzir) e o tradicional comando satélite na coluna da direção, utilizado pela Renault desde os anos 80.

Evolução

Mas como o Captur TCe se sai quando comparado ao seu antecessor, o Captur Intense 2.0? A evolução de motor e câmbio é inquestionável, mas houve algumas pequenas perdas no caminho sem comprometer a impressão de evolução geral do modelo. Na parte externa a única peça modificada foi o parachoque dianteiro, agora mais protuberante e com mais vincos, o que rendeu ao Captur TCe 5cm a mais no comprimento:

Captur Intense 1.3T (e) e 2.0 (d)

 

Para além do visível o Captur TCe sofreu também algumas modificações com relação ao modelo 2018. A roda do estepe que antes era de 16” (diferente das demais rodas, que são de 17”) agora é temporária; a canaleta de proteção das linhas de freio e combustível, que era de chapa de metal, agora é de plástico; e as portas dianteiras perderam uma guarnição de borracha.

Já o interior ganhou alguns mimos, sendo o mais visível deles o novo console central, que no entanto deixou a alavanca do freio de mão mais curta e distante do motorista, portanto menos cômoda de usar:

Os parassois ganharam iluminação e o forro do teto agora é preto:

E como prova de que a Renault revisou até mesmo itens fora do alcance da visão, a cobertura abaixo da caixa de fusíveis, antes um plástico ondulado de péssimo aspecto, passou a ser de material acarpetado:

Dentre as perdas, a mais curiosa delas talvez seja o gancho de reboque presente no modelo anterior (posicionado em uma das cavidades laterais do porta-malas) e abandonado no novo modelo.

Outro fato curioso é que suspensão dianteira do Captur 1.3T é visivelmente mais alta que a do Captur 2.0. Será que a Renault manteve a mesma carga das molas nas duas versões e o Captur 2.0 ficava mais baixo por conta do maior peso do motor?

Desempenho, consumo e impressões ao rodar

Pode-se dizer que o novo conjunto motriz trouxe nova vida ao Captur, que na versão 1.6L tinha sua morosidade acentuada pelo acerto da CVT, enquanto a versão 2.0 até demonstrava boa agilidade nas saídas mas pecava na transmissão de 3 marchas + Overdrive que criava “buracos” entre as marchas, afetando o desempenho, consumo e conforto. Claro que somente os números do motor já seriam suficientes para causar grande diferença, mas o casamento com a CVT (tanto na calibração como no conversor de torque) aproveitou bem as virtudes do motor. Comparando com a versão 2.0l, a potência passou dos 143/148cv@5750rpm (Gasolina/Etanol) para bons 162/170cv@5500rpm, enquanto o torque subiu dos 20,2/20,9kgfm@4000rpm para 27,5kgfm já em 1600rpm com ambos os combustíveis. Na comparação de consumo em trajetos semelhantes entre o Captur 2.0 e o 1.3T houve uma melhora de 9%, tanto justificada pela CVT que mantém o giro baixo e constante em uso urbano normal, como pelo motor mais tecnológico que conta com injeção direta e cilindrada menor. Vale lembrar que motores menores com turbo não são necessariamente mais econômicos em todas as condições, pois precisam trabalhar com excesso de combustível quando começam a pressurizar o turbo. Porém no uso urbano há vantagem no consumo pelo fato de ser um motor de peças e massas menores para seu simples funcionamento, sendo raras as situações em que o turbo enche, exigindo enriquecimento de combustível. Principalmente rodando com etanol, que permite até certas pressões de turbo antes de enriquecer a mistura.

No quesito desempenho a diferença foi ainda maior. Enquanto o Captur 2.0L levou 12,3s e 18,5s para chegar aos 100km/h e 400m, o Captur 1.3T levou 9,4s e 16,6s:

Na figura acima é possível ver a diferença no ganho de velocidade do 1.3T em relação ao 2.0L. Também é interessante notar que a CVT simula 8 marchas durante a aceleração, mantendo a rotação entre 5000-5500rpm enquanto o 2.0L utiliza apenas 3 marchas, já que a quarta é Overdrive para melhor consumo em estrada. Com certeza o 2.0L ganharia muito se tivesse uma CVT, pois com o câmbio 4 marchas precisa de giro para gerar potência (como todo motor aspirado 16v). Como a rotação cai muito de uma marcha para outra, a potência média entregue ao solo é muito menor que os 148cv declarados (se tivéssemos a curva de torque poderíamos calcular) enquanto o 1.3T entrega uma potência média muito mais próxima dos 170cv.

Porém o Captur 1.3T seria capaz de números ainda melhores se a Renault tivesse mantido a rotação do motor constante em vez de simular marchas para agradar motoristas que reclamam do ruído constante do motor. Tudo bem que 8 marchas derrubam apenas 500rpm numa faixa de rotação em que o motor turbo tem potência quase constante e isso não traz tanta perda de tempo, mas a Renault fez questão de fazer parecer que se está trocando marchas, pois se sente até aquela oscilação na aceleração típica de carro manual. Primeiro achamos que a borboleta do motor se fechava mas ao analisar os dados percebemos que a Renault “mata” o motor atrasando o ponto de ignição (vulgo avanço) para criar tal efeito:

Fica complicado julgar a decisão da Renault visto que a proposta é justamente trazer a sensação de desempenho nessas oscilações de entrega de potência, mas seria interessante ver como seriam os números se ao menos não se atrasasse o ponto de ignição, criando um pulo à frente cada vez que a CVT passasse para a marcha seguinte, aproveitando toda a carga e inércia do motor.

Outro ponto a destacar é o intercooler alocado lateralmente ao radiador, o que aumenta sua eficiência e consequentemente permite que ele seja menor. Durante as acelerações a temperatura do ar no coletor de admissão (IAT) subiu para 57ºC, 35ºC acima da temperatura ambiente. Tal valor é considerado bom, ainda mais levando em conta um motor que deve trabalhar com boa pressão de turbo (infelizmente o canal MAP, que mostra pressão de turbo não estava mostrando os dados no equipamento utilizado para medição) já que gera 130cv/litro de cilindrada.

Outra vantagem de tal solução é que em trechos de baixo fluxo de ar, como uma subida de serra atrás de um ônibus ou no trânsito, a ventoinha garante temperaturas menores de admissão de ar. Isso não visa apenas potência mas principalmente economia de combustível em situações que ar mais quente acarretaria aumento de chances de bater pino e consequentemente atraso no ponto de ignição.

Conclusão

Não é exagero dizer que o motor 1.3T aliado ao câmbio CVT deu nova vida ao Captur. Se antes parecia um carro pesado e lento, especialmente na versão 1.6, agora a condução do Captur passa sensação de leveza e agilidade, ainda por cima com consumo de combustível menor. Há razões para comprar um Captur: a suavidade e silêncio de rodagem estão entre os melhores do segmento, assim como o tamanho do porta-malas; o design mais suave que a concorrência agrada a determinada parcela dos consumidores (e desagrada a outra, claro); e com o novo motor tornou-se um carro prazeroso de se conduzir tanto em cidade quanto em estrada. Aspectos não tão positivos são o interior, ainda que melhorado em relação às versões anteriores ainda passa sensação de acabamento mais simples que alguns concorrentes; e a falta de algum refinamento técnico como suspensão traseira multilink, discos de freio traseiros e equipamentos de condução semiautônoma. Ainda que esses equipamentos possam fazer falta, vale a pena um test drive para conferir os novos atributos dinâmicos do Captur TCe na prática.

 

 

Comentar (1)

  1. Germinal Vilchez

    Excelente análise. O carro melhorou demais com a nova motorização e câmbio.
    A Duster também merecia o mesmo powertrain.

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